quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Nem a tortura cala os sapatos

Muntazer Al Zaidi, o jornalista iraquiano que jogou sapatos em Bush filho, no dia 14 de setembro de 2008, em sua última visita a Bagdá, foi preso e torturado pelo governo títere daquele país. Mas nada será capaz de apagar o ato de coragem daquela homem.

Jogar sapatos em outra pessoa é um ato de profundo desprezo na cultura árabe e islâmica. Jogou os sapatos gritando: “este é o seu beijo de despedida do povo iraquiano, seu cachorro", "Isto é pelas viúvas e órfãos e todos os mortos no Iraque".

Na confusão que se sucedeu, a assessora da Casa Branca Dana Perino, que foi atingida por um microfone, declarou que "um homem atirando seus sapatos não representa o povo iraquiano como todo". Apesar de que no dia seguinte milhares de pessoas saíram às ruas para exigir a libertação de Zaidi, em uma coisa a lambebotas de Bush tem razão. O povo iraquiano como um todo não está jogando sapatos nos ianques, mas balas e bombas, e se não o fizeram no gerente do império foi por mera falta de oportunidade. Mas, como ato simbólico, os sapatos até que cumpriram seu papel.

Após seu ato de bravura o jornalista ficou nove meses preso sendo barbaramente torturado pelos sabujos do governo títere. Libertado no dia 15 de setembro, Muntazer Al Zaidi pede o indiciamento de Bush por crimes de guerra.

Na segunda feira, 19 de outubro, O Estado de São Paulo publicou uma entrevista com Zaidi, que reproduzimos abaixo. Como não poderia deixar de ser, o veneno escorre pelos cantos da boca na chamada da entrevista: “Com um terno impecável e relógio de luxo, ele...”, como se isso fosse crime. E mais à frente “Mas sua viagem é permeada de mistérios. Ele não diz quem o financia, qual seu programa na Europa...”. Quanto às torturas que sofreu não há mistério nenhum quanto a quem financiou.

Segue a entrevista:



O senhor imaginava que sua ação contra Bush teria tal repercussão?

De jeito nenhum. Sabia que iria ser difundido pelo mundo. Mas não dessa forma. O que eu fiz não foi como jornalista, foi como cidadão iraquiano indignado por tudo o que vivemos. Estamos com invasores há sete anos. A guerra já somou um milhão de mortos, um milhão de viúvas e 5 milhões de órfãos. Eu não sou e nem quero ser visto como herói. Fiz como um grito de indignação.

O que ocorreu com o senhor após sua prisão naquela sala de imprensa?

Nos três dias seguintes a minha prisão sofri o pior que alguém possa imaginar. A tortura chegou a níveis sem explicação. Fui duramente atingido por barras de ferro, cabos elétricos e tive minha cabeça colocada em um balde de água. Não queriam nada. Não pediam nada. Só me torturavam. Perdi vários dentes, tenho problemas sérios nas costas e claro, tenho medo de que haja uma vingança contra minha família que ainda está no Iraque.

Quem o torturava?

A tortura era realizada por iraquianos mesmo. Mas sob ordens dos americanos. Eles não tinham pena nenhuma.

O que deve ser feito a partir de agora que Bush não está no poder?

Ele e todos os responsáveis pela guerra precisam ser julgados por crime de guerra. Além disso, precisa haver um mecanismo para indenizar o povo do Iraque pelo sofrimento e destruição. Na guerra entre Iraque e Kuwait, a ONU criou uma comissão de compensações para dar dinheiro de forma muito correta ao povo do Kuwait que sofreu com a invasão de Saddam Hussein. Agora, o mesmo deve ser criado para o Iraque. Sofremos abusos e violações graves de direitos humanos.

Mas essas violações não existiam sob o regime de Saddam Hussein?

Claro que sim. Não estou defendendo Saddam nem nada do estilo. O que ocorreu foi uma ditadura impressionante que matou muita gente. Mas o que não esperávamos é que os supostos libertadores cometeriam crimes também.

Qual sua opinião sobre Barack Obama?

Depois de ele tirar os soldados americanos do Iraque eu direi.

E sobre o Iraque?

O país está sem rumo. A guerra não gerou ganhadores. Só perdedores.

O senhor está lançando uma fundação. Para que servirá a entidade?

Meu objetivo é coletar recursos para ajudar os mais indefesos no Iraque. Esses são os órfãos, viuvas e deficientes. Parte do meu trabalho ainda será para garantir proteção aos jornalistas.

Após seu ato contra Bush, governos árabes deixaram claro que estavam dispostos a lhe recompensar. Quanto o senhor recebeu após aquela conferência?

De fato tive ofertas de muitos presentes. Mas não aceitei nenhum.

Onde está o sapato que o senhor atirou em Bush?

Tentei saber, mas o governo deve ter destruído. Minha idéia era de colocar a leilão e, com o dinheiro, ajudar famílias de vítimas.



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